Oppenheimer: qual era a relação do físico com Lewis Strauss?
Oppenheimer chegou aos cinemas na última quinta-feira (20) e um grande foco do seu debate é nas audiências pelas quais o físico precisa passar para provar a sua lealdade ao estado norte-americano.
Uma das revelações que o filme faz logo em seu terceiro ato é o envolvimento de Lewis Strauss na formentação de provas contra Oppenheimer. Após assistir o filme, que se baseia na vida real, muito se questiona se alguns dos fatos apresentados foram reais.
O quanto era verdade sobre os fatos que foram retratados no filme?
J. Robert Oppenheimer e Lewis Strauss tiveram uma relação marcada por diferenças e controvérsias, especialmente em relação ao Projeto Manhattan e ao desenvolvimento da bomba atômica.
J. Robert Oppenheimer foi um físico teórico americano que desempenhou um papel fundamental no Projeto Manhattan durante a Segunda Guerra Mundial. Ele foi o diretor científico do Laboratório de Los Alamos, onde a bomba atômica foi desenvolvida.
Lewis Strauss, por outro lado, foi um empresário e funcionário público americano que atuou como presidente da Comissão de Energia Atômica dos Estados Unidos (AEC) de 1953 a 1958. A AEC era a agência responsável pela supervisão das atividades nucleares, incluindo o desenvolvimento e a regulamentação de armas nucleares. Ele era um defensor ferrenho da bomba de hidrogênio e da manutenção do segredo sobre as pesquisas nucleares americanas.
Ele também era um anticomunista fervoroso e desconfiava das simpatias políticas de Oppenheimer.
A relação entre Oppenheimer e Strauss se tornou tensa e contenciosa durante o período da Segunda Guerra Mundial e após o término do conflito. Oppenheimer era conhecido por suas posições liberais e suas opiniões políticas de esquerda, o que suscitou preocupações e suspeitas sobre sua lealdade e segurança por parte de alguns setores conservadores do governo dos EUA.
Essas preocupações foram agravadas durante a década de 1950, quando os Estados Unidos estavam imersos na Guerra Fria com a União Soviética. Oppenheimer foi investigado por supostas ligações com membros do Partido Comunista e teve seu acesso às informações confidenciais negado. Lewis Strauss, como presidente da AEC, teve um papel importante nas audiências de segurança que levaram à revogação das credenciais de segurança de Oppenheimer em 1954.
O caso de Oppenheimer tornou-se um ponto central do macarthismo (período de perseguição e caça às bruxas anticomunistas nos EUA) e teve um impacto significativo em sua carreira e reputação. Embora a decisão de revogar suas credenciais de segurança tenha sido revertida em 1963, Oppenheimer foi profundamente afetado pelas acusações e pelo tratamento que recebeu.
O que foi o macarthismo?
O macarthismo foi um período de intensa perseguição política e ideológica aos supostos comunistas nos Estados Unidos, entre as décadas de 1940 e 1950, no contexto da Guerra Fria. O termo se origina do nome do senador republicano Joseph McCarthy, que liderou uma campanha de acusações infundadas, censura, difamação e violação dos direitos civis contra pessoas e instituições que ele considerava antiamericanas ou subversivas.
O macarthismo ficou conhecido como a “caça às bruxas” moderna, pois usava delações, interrogatórios, intimidações e listas negras para marcar e isolar os acusados, que muitas vezes eram inocentes ou apenas simpatizantes de ideias socialistas.
O conceito perigoso atingiu principalmente o serviço público, a indústria do entretenimento, os sindicatos, os cientistas e os educadores. Depois de um tempo, acabou perdendo força quando McCarthy começou a atacar o próprio governo e o exército, gerando uma reação negativa da opinião pública e dos meios de comunicação.
O macarthismo deixou um legado de medo, desconfiança e hostilidade ao comunismo nos Estados Unidos e em outros países do continente americano.
Strauss traiu Oppenheimer?
Não, Strauss não traiu Oppenheimer nem era um espião do Projeto Manhattan. Eles eram colegas na Comissão de Energia Atômica dos Estados Unidos (AEC), mas tinham opiniões diferentes sobre o desenvolvimento e o uso de armas nucleares. Strauss era a favor da construção da bomba de hidrogênio, enquanto Oppenheimer era contra.
Suspeitando das simpatias comunistas de Oppenheimer, que tinha se envolvido com pessoas ligadas ao Partido Comunista no passado, em 1954, Strauss iniciou uma série de audiências para questionar a segurança de Oppenheimer e acabou conseguindo revogar sua autorização para trabalhar no governo. Isso prejudicou a carreira e a reputação de Oppenheimer, que passou a se dedicar à academia até sua morte em 1967.
A ideia de que Lewis Strauss “traiu” J. Robert Oppenheimer pode ser vista de diferentes perspectivas, dependendo de como se interpreta o papel de Strauss nos eventos relacionados ao caso de Oppenheimer e às audiências de segurança que levaram à revogação de suas credenciais de segurança.
Como mencionado anteriormente, durante a década de 1950, Oppenheimer enfrentou um escrutínio significativo devido às suas posições políticas de esquerda e às suspeitas de ligações com membros do Partido Comunista. O governo dos Estados Unidos estava profundamente envolvido na Guerra Fria e era preocupado com a segurança nacional, incluindo a possível infiltração comunista nas instituições governamentais.
Lewis Strauss, como presidente da Comissão de Energia Atômica (AEC), teve um papel influente nas audiências de segurança que resultaram na revogação das credenciais de segurança de Oppenheimer em 1954. Strauss apoiou a decisão de negar o acesso de Oppenheimer a informações confidenciais, citando preocupações sobre sua confiabilidade e sua capacidade de manter segredos sensíveis relacionados às armas nucleares.
A revogação das credenciais de segurança de Oppenheimer foi um evento altamente controverso e gerou opiniões divergentes. Alguns consideraram que Oppenheimer estava sendo tratado injustamente e que sua contribuição para o Projeto Manhattan deveria tê-lo protegido de tal tratamento. Outros, incluindo aqueles que apoiavam a posição de Strauss, argumentavam que a segurança nacional deveria prevalecer e que Oppenheimer apresentava riscos de segurança devido às suas associações e crenças políticas.
Portanto, a questão de se Strauss “traiu” Oppenheimer é uma questão de interpretação e opinião. Alguns podem ver as ações de Strauss como uma resposta legítima aos temores de segurança da época, enquanto outros podem vê-las como um ataque injusto a um cientista notável que contribuiu significativamente para o desenvolvimento da bomba atômica. O caso de Oppenheimer e a sua relação com Lewis Strauss continuam sendo um tópico de debate e análise histórica.
Conversa com Albert Einstein – o que quer dizer o final do filme?
Oppenheimer chega a uma conclusão próxima de seu início, com Oppenheimer e Albert Einstein conversando à beira de um lago. No entanto, desta vez, a cena é apresentada de forma mais íntima, com os espectadores testemunhando o diálogo em primeira mão, ao invés da perspectiva distante e silenciosa de Lewis Strauss.
Em um momento de troca amigável, Einstein oferece algumas palavras de sabedoria a Oppenheimer sobre o que o futuro lhe reserva, alertando que suas reflexões podem ser um tanto sombrias. Agora que o governo, a comunidade científica e o mundo em geral obtiveram o que queriam de Oppenheimer, ele perceberá que pode ser reduzido a pouco mais do que um troféu a ser exibido.
Em seguida, Oppenheimer redireciona a conversa para um encontro anterior que a dupla teve durante os estágios iniciais do desenvolvimento da bomba atômica. Eles discutem a preocupante possibilidade de uma explosão em cadeia que poderia inflamar a atmosfera e levar à extinção de toda a vida na Terra.
Oppenheimer relembra então suas ponderações sobre a destruição do mundo na época e compartilha com Einstein suas dúvidas sobre se sua própria invenção foi responsável por colocar o mundo à beira da ruína.
Como foi revelado pouco antes, na segunda metade do filme, Strauss foi uma força impulsionadora por trás do afastamento do personagem de Oppenheimer. Além disso, ele foi responsável pela revogação da autorização Q do renomado físico, cortando assim sua conexão com os desenvolvimentos atômicos classificados sancionados pelo governo e suas pesquisas.
Qual foi a motivação de Strauss?
Strauss ficou tomado por sua própria paranoia em relação à conversa mencionada entre Oppenheimer e Einstein, chegando a imaginar que Oppenheimer o estava o difamando de algum jeito. Não é difícil acreditar que a queixa de Lewis é plausível, visto que ele era um republicano, e republicanos usam atualmente “achismos” para justificarem suas suspeitas contra seus inimigos.
No entanto, como já sabemos, é bem provável que Einstein estivesse apenas reflexivo sobre o peso das palavras de Oppenheimer a respeito da destruição do mundo, durante seu papo com Strauss.
A partir daí, Strauss decidiu usar todo e qualquer elemento possível contra Oppenheimer para desacreditá-lo. Desde suas conexões anteriores com o comunismo até alegações (e algumas comprovadas) de adultério, tudo aquilo que poderia lançar dúvidas sobre o comportamento de Oppenheimer durante sua liderança no Projeto Manhattan em Los Alamos foi minuciosamente vasculhado. E, bem, sabemos como essa história terminou.
Mas, como a vida costuma nos ensinar, o ódio cego pode voltar como um bumerangue – e Strauss aprendeu isso da pior maneira possível.
Mais tarde, na audiência do Secretário de Comércio, ele acabou sendo rejeitado para um alto cargo no governo após cientistas notáveis e figuras importantes do filme revelarem seu envolvimento na campanha de descredibilização de Oppenheimer perante o público.
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