A NÃO ESSÊNCIA HUMANA EM: “ISTO É UM HOMEM?” DE PRIMO LEVI A PARTIR DO OLHAR SARTRIANO.

 


A NÃO ESSÊNCIA HUMANA EM: “ISTO É UM HOMEM?” DE PRIMO LEVI A PARTIR DO OLHAR SARTRIANO.


Diego Avelino de Macêdo¹

Introdução

O homem motivado por instintos primitivos se construiu em sociedade durante milênios. As entrelinhas históricas provam, exatamente, tal fato ao observar que à luta pela soberania e a dominação sobre outros sujeitos constituíram-se exímias marcas na história. Diante disso, ocorreu em pleno século XX duas grandes guerras tão avassaladoras e chocantes, que seus feitos macabros e animalescos sempre estarão presentes nos anais históricos. Todavia, ressalte-se que a mais marcante dentre as duas, sem dúvida, foi a II Grande Guerra Mundial. Este, por sua vez, promoveu uma “quase” destruição global conseguindo afetar abruptamente à constituição identitária de seus sujeitos (co)participantes gerando seres desconhecedores da sua própria existência humana.


Desconstrução existencial

Os campos de concentrações alemães espalhados pela Europa promoveram as mais absurdas atrocidades contra à dignidade, liberdade e autonomia dos sujeitos. A morte, quando não era promovida por meios “rápidos” era lentamente agonizante. A distorção do real gerido pelo esfacelamento existencial, em cada sujeito – entendam-se, os encarcerados – culminou num pulverizar do Eu que, dada animalesca situação, não importava mais estar em existência neste mundo. O homem perdeu sua condição humana!

Para conhecer – de forma mais realista – acerca dos acontecimentos na II Guerra, nada melhor do que visitar uma das obras mais memoriáveis de Primo Levi. Este foi químico de origem italiana com descendência judaica. Graças, a origem semita, Primo Levi, resgatou da sua memória os relatos vivenciados durante o seu encarceramento na II Guerra Mundial.



¹ Licenciado em História (UnP) e em Filosofia (UFRN). Possui especialização em Docência no Ensino Superior (UnP). Atua(ou) lecionando os seguintes componentes curriculares: Artes, História, Filosofia, Sociologia, Religião, Idioma Hebraico (A1 – nível básico) em escolas de ensino regular da rede pública e privada, além da UFRN. Atualmente, é professor do quadro permanente do RN, militar, escritor, tradutor, compositor e orientador de trabalhos em trabalhos científicos.

E-mail: diegoavelinohistoriador@yahoo.com.br


Primo Levi foi membro de um grupo guerrilheiro italiano que, após ser denunciado foi capturado pelos alemães. Tempo depois, Primo Levi, estava sendo enviado a um campo de concentração (lager – em alemão). Transferido para Auschwitz, Primo Levi ficou confinado por dois [longos e míseros] anos neste campo de concentração.

Neste espaço de “concentração animal”, as barbáries cometidas ultrapassavam o limite do senso humanitário. O vociferas tratamento prestado aos encarcerados afetou diretamente na constituição identitária de cada sujeito promovendo uma nulidade do si. Não importava mais se permitir existir! Era necessário se permitir sobreviver!

Cada corpo moribundo não possuía história [pessoal], e nem deixava marca alguma socialmente. Por quê? Simplesmente, os sujeitos não eram nada. O que eles eram, afinal? Apenas, números; trabalhadores braçais; cobaias científicas entre outros. Não havia uma “definição” do si porque inexistia o existir.


[...], o homem existe, encontra a si mesmo, surge no mundo e só posteriormente se define. O homem, tal como o existencialista o concebe, só não é passível de uma definição porque, de início, não é nada: só posteriormente será alguma coisa e será aquilo que ele fizer de si mesmo. [SARTRE, 1970, p.04].


Toda essa sobrecarga desumana alemã permitiu apagar lentamente, assim como impedir que cada sujeito pudesse se fazer/construir para o seu porvir existencial. Quem agora, portanto, poderia dizer que era um sujeito social construído/formado dentro de um escopo ético e moral naquelas condições desumanas? Nada mais importava!

As vozes dos rejeitados, literalmente, passaram a ser bradadas e ouvidas, graças, a obra colossal de Primo Levi. O pessimismo é latente, absoluto e sempre fermentado pela espera desgraçada de um momento (não) vivido. O futuro...não existe! Esperança...não há! As próprias dores e sofrimentos conseguem burlar o duro momento forjando sujeito(os) que se desconhece(m) entre os demais. Basicamente, seriam os homens: “[...] os seres silenciosos que foram lentamente desconstituídos intelectual, psicológica e moralmente até o definitivo apagamento, que os conduziu à indiferença e à morte.” [GARCIA; MARTINS, 2017, p. 11].

Perpassando-se os relatos de uma dada situação temporal é salvável entender, que a fundamentação ontológica de cada sujeito precisa acontecer no encontrar e, ao mesmo tempo, no sentir-se pertencente a um contexto/círculo/grupo. Havendo qualquer distorção na sua identificação pessoal – intrínseca e/ou extrínseca, o caos subjetivo consumirá o seu Eu. Eis, algumas observações incomensuráveis sobre a constituição do nosso ente:


  1. A existência humana é o fator determinante para a constituição do si. Sem àquela, o ser humano se perde diante da sua realidade, não sabendo mais diferenciar o limiar entre “Humano versus Animal”; e

  2. A formação essencial de cada sujeito ocorre mediante sua interação social. Mesmo permitindo-se interagir dentro de um grupo marginalizado, o ser humano irá existir. Todavia, sua existência será meramente focada em condições primitivas do Eu. O melhor será negar-se, enquanto, sujeito para não dar vazão aos impulsos instintivos.


Portanto, o ser humano precisará estar partícipe sempre no seu invólucro social mesmo assumindo papeis diferentes daqueles predefinidos. A natureza do si deve ser estendida e expandida não podendo estar esfacelada diante de uma mentalidade totalitária. Para isso, o sujeito deve estar, meramente, sendo partícipe da sua realidade havendo a possibilidade dele, sem dúvida, saber se conhecer ao mesmo tempo em que ele se faz.

Referências


GARCIA, Neiva Kampff. MARTINS, Claúdia Mentz. O silêncio audível em É isto um homem?, de Primo Levi. Nau Literária: crítica a teoria da literatura em língua portuguesa. PPG-LET UFRGS, Vol. 13 N. 02/2017. Literatura e Confinamento II. ISSN: 1981-4526. Disponível: http://seer.ufrgs.br/nauliteraria.


LEVI, Primo. É isto um homem?. Tradução de Luigi del Re. Rio de Janeiro: Rocco, 1988.


SARTRE, Jean -Paul. Esboço para uma teoria das emoções. Tradução: Paulo Neves. – Porto Alegre: L&PM (Coleção L&PM Pocket Plus), 2008.


SARTRE, Jean-Paul. O existencialismo é um humanismo. Tradução: Rita Correia Guedes. L’Existentialisme este um Humanisme, Les Éditions Nagel, Paris, 1970.


SARTRE, Jean-Paul. O imaginário: Psicologia fenomenológica da imaginação. Edição revista por Arlene Elkaint-Sartre. Tradução de Duda Machado – São Paulo: Ed. Ática, 1996.


SARTRE, Jean-Paul. O ser e o nada: ensaio de ontologia fenomenológica. 15 ed., tradução de Paulo Perdigão – Petrópolis, Rio de Janeiro: Ed. Vozes, 2007.



































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