Meu Amigo Pedro





Meu Amigo Pedro

Raul Seixas


Muitas vezes, Pedro, você fala
Sempre a se queixar da solidão
Quem te fez com ferro, fez com fogo, Pedro
É pena que você não sabe não

Vai pro seu trabalho todo dia
Sem saber se é bom ou se é ruim
Quando quer chorar vai ao banheiro
Pedro, as coisas não são bem assim

Toda vez que eu sinto o paraíso
Ou me queimo torto no inferno
Eu penso em você, meu pobre amigo
Que só usa sempre o mermo terno

Pedro, onde cê vai eu também vou
Pedro, onde cê vai eu também vou
Mas tudo acaba onde começou

Tente me ensinar das tuas coisas
Que a vida é séria e a guerra é dura
Mas se não puder, cale essa boca, Pedro
E deixa eu viver minha loucura

Lembro, Pedro, aqueles velhos dias
Quando os dois pensavam sobre o mundo
Hoje eu te chamo de careta, Pedro
E você me chama vagabundo

Pedro, onde cê vai eu também vou
Pedro, onde cê vai eu também vou
Mas tudo acaba onde começou

Todos os caminhos são iguais
O que leva à glória ou à perdição
Há tantos caminhos, tantas portas
Mas somente um tem coração

E eu não tenho nada a te dizer
Mas não me critique como eu sou
Cada um de nós é um universo, Pedro
Onde você vai eu também vou

Oh! Yes!

Pedro, onde cê vai eu também vou
Pedro, onde cê vai eu também vou
Mas tudo acaba onde começou
É que tudo acaba onde começou


SIGNIFICADO:

"Meu Amigo Pedro" é uma das canções mais profundas e pessoais de Raul Seixas, uma conversa íntima e, ao mesmo tempo, um manifesto filosófico. A música explora o conflito entre duas visões de mundo opostas, representadas pelo eu-lírico (o próprio Raul) e seu amigo Pedro.


O Conflito entre Duas Vidas

Pedro representa a vida convencional e conformista. Ele é a figura do homem comum, que segue as regras, trabalha em um emprego que não o satisfaz ("Sem saber se é bom ou se é ruim") e reprime suas emoções ("Quando quer chorar vai ao banheiro"). Ele vive uma vida séria, dura e segura, marcada pela monotonia ("mermo terno"). A solidão de Pedro não é física, mas existencial, causada pela falta de sentido em sua rotina.

O eu-lírico (Raul), por outro lado, representa a vida alternativa e libertária. Ele abraça os extremos ("sinto o paraíso" ou "me queimo torto no inferno") e valoriza a loucura, a busca por algo maior e a individualidade. Essa vida, porém, não é isenta de perdas, o que explica a tristeza e a compaixão que ele sente por Pedro ("meu pobre amigo").


A Tensão e a Aceitação

A canção mostra a tensão entre esses dois mundos. Raul chama Pedro de "careta", enquanto Pedro o chama de "vagabundo", evidenciando o julgamento mútuo. No entanto, a música não é sobre quem está certo, mas sobre a aceitação das diferenças.

A frase repetida, "Pedro, onde cê vai eu também vou / Mas tudo acaba onde começou", é a chave para a compreensão da canção. Ela pode ser interpretada de duas formas:

  1. A Unidade dos Extremos: Embora sigam caminhos diferentes, ambos se encontram no ponto de partida e no ponto final da vida, a única certeza. No fundo, a experiência humana é a mesma para todos, não importa a escolha.

  2. O Destino Comum: A vida de um é tão "caminho" quanto a do outro. Os caminhos podem parecer diferentes, mas a origem e o fim são os mesmos para todos.


A Filosofia por Trás da Letra

O cerne da mensagem de Raul Seixas está nos versos finais: "Cada um de nós é um universo, Pedro". Essa é a essência de sua filosofia, que celebra a individualidade e a busca por um caminho único.

  • A crítica à conformidade: Raul questiona a ideia de que há um único caminho certo a ser seguido. Ele desafia a seriedade e a dureza da vida que Pedro defende, propondo que a verdadeira vida está na "loucura" de ser quem se é.

  • O caminho com coração: A citação "somente um tem coração" é uma referência direta ao livro A Estrada de Ixtlan, de Carlos Castaneda. A filosofia de Castaneda, que influenciou Raul, diz que um caminho só é válido se for "com coração", ou seja, se for verdadeiro e significativo para a pessoa que o segue.

  • A tolerância e a não-crítica: Ao afirmar "não me critique como eu sou", Raul pede respeito à sua escolha de vida, ao mesmo tempo em que ele mesmo demonstra compaixão por Pedro, sem julgá-lo.

Em resumo, "Meu Amigo Pedro" é uma reflexão sobre a jornada da vida e a liberdade de escolher seu próprio caminho. A canção celebra a beleza da diferença e a aceitação de que cada pessoa é um universo único e inalienável.


Conflito de escolhas e autenticidade em “Meu Amigo Pedro”

“Meu Amigo Pedro”, de Raul Seixas, explora o contraste entre o conformismo e a busca por liberdade individual. Inspirada tanto na relação de Raul com seu irmão Plínio quanto na experiência de Paulo Coelho com seu pai, a música traz um embate familiar e pessoal. O verso “Vai pro seu trabalho todo dia / Sem saber se é bom ou se é ruim” mostra Pedro preso a uma rotina sem questionamentos, enquanto “Eu penso em você, meu pobre amigo / Que só usa sempre o mermo terno” reforça a crítica à vida padronizada e sem ousadia. Apesar disso, Raul não condena Pedro, mas expressa compaixão e certa incompreensão diante de escolhas diferentes.

A canção também aborda o direito de viver de forma autêntica, como no trecho “E deixa eu viver minha loucura”, que faz referência ao conceito de “loucura controlada” de Carlos Castañeda. Aqui, a rebeldia do narrador é apresentada como uma escolha consciente, não como descontrole. O refrão “Pedro, onde cê vai eu também vou / Mas tudo acaba onde começou” sugere que, apesar dos caminhos distintos, todos compartilham a mesma origem e destino. Assim, Raul propõe respeito às diferenças e valoriza a autenticidade diante das pressões sociais, defendendo que cada pessoa deve ser livre para seguir seu próprio caminho.

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