Geografia Humana 2


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REVISTA CIENTÍFICA ELETRÔNICA TURISMO

PERIODICIDADE SEMESTRAL – ANO III EDIÇÃO NÚMERO 5 – JUNHO DE 2006
SISTEMAS PRODUTIVOS, DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO E DEGRADAÇÃO AMBIENTAL.
SILVA, Odair Vieira da.
Bacharel e Licenciado em Geografia UNESP – FCT
Pós-graduado em Ciências Humanas – Cidadania e Cultura – UNICAMP
Pós-graduado em Legislação Ambiental e Turismo - FAEF – ACEG.
Professor do curso de Turismo da FACULDADE DE CIÊNCIAS HUMANAS – FAHU – GARÇA – SÃO PAULO - BRASIL
odairvieiras@hotmail.com
RESUMO
O presente artigo tem como objetivo oferecer uma reflexão sobre as transformações na concepção de natureza e as modificações sócio-econômicas, políticas e culturais ocorridas a partir do século XV. A ênfase se dará sobre o desequilíbrio ambiental, em torno da proposta de se pensar na transição de uma sociedade de produtores para uma sociedade de consumidores. Por fim abordaremos os principais problemas ambientais da sociedade moderna e pós-moderna e de que modo isso se reflete na perda da qualidade de vida dos seres humanos.
PALAVRAS CHAVE: Sociedade, natureza, desenvolvimento, meio-ambiente.
Tema Central: Turismo
ABSTRACT
The present article has as objective to offer a reflection about the transformations in the nature conception and the socioeconomic modifications, political and cultural who happened since 15th century.
The emphasis will actl on the environmental unbalance, around the proposal of thinking in the transition of a society of producers for a society of consumers. Finally we will approach the main environmental problems of the modern and post-modern society and that way that is reflected in the loss of the human beings' quality of life.
KEY WORDS: Society, nature, development, environment, industrialization.
1. Introdução
O interesse da sociedade e da comunidade científica pelas questões ambientais não é tão recente. Hodiernamente a emergência dessa temática está intimamente ligada à perda de qualidade de vida dos seres humanos devido ao caráter predatório e dilapidador do meio ambiente relacionado a uma apropriação desregrada da natureza, o que tem provocado o esgotamento e a poluição de elementos vitais a vida de qualquer ser vivo e da humanidade.
O presente artigo pretende abordar essas inadequações provocadas pelo desenvolvimento dos sistemas produtivos e a conflituosa relação sociedade/natureza.
Em linhas gerais, será abordada a união entre a interpretação mecanicista e materialista do universo, e os sistemas baseados no pensamento e na razão humana, que de certa forma tornaram obsoletas as concepções teológicas.
Por fim, será abordada a contemporaneidade dos principais problemas ambientais agravados pela construção de um “espaço” cada vez mais instrumentalizado, culturizado, e tecnificado e cada vez mais trabalhado segundo os ditames dos processos produtivos e da ciência.
2. A relação sociedade e natureza e suas principais inadequações
A emergência da temática ambiental na atualidade, segundo Mendonça (2001), se reveste de grande importância devido a três fatos: O caos da qualidade de vida da população, que se acentuam nos grandes centros urbano-industriais; o alarmismo da mídia, que trazem a tona de maneira sensacionalista os problemas locais e globais relacionados à degradação do meio ambiente, e o papel das ciências, das artes e da atividade política.
No entanto, a natureza e o meio ambiente de maneira geral, bem como as questões inerentes à degradação que sofreram ao longo do desenvolvimento histórico das sociedades humanas, têm servido de escopo para análise de diversos pensadores interessados em estudar a fúria destruidora dos sistemas produtivos.
Porém, antes de desenvolvermos uma análise sobre as questões relacionadas aos impactos provocados pelos sistemas produtivos e pelas atividades humanas sobre a natureza, é preciso resgatar um pouco da história da evolução tecnológica e científica da humanidade relacionada com a Revolução Industrial e o crescente processo de urbanização.
Para iniciarmos esta análise, vamos nos reportar a passagem do feudalismo para o capitalismo, período esse marcado pelo renascimento das ciências, renascimento das cidades, pela expansão comercial e marítima européia e pela produção para o mercado.
Essa sucessão de fatos ocorridos na transição do feudalismo para o capitalismo gerou um grande progresso comercial e urbano, criando uma nova realidade econômica
que marcou o início da chamada era moderna. O resultado dessas mudanças foi uma significativa alteração de comportamento das sociedades humanas frente à natureza.
Houve uma grande mudança na concepção de natureza, passando de um todo orgânico para uma simples idéia mecanicista e materialista, que produziu efeitos que ainda hoje perduram, notadamente sobre a atitude das pessoas em relação ao meio ambiente natural.
As transformações engendradas no início da era moderna influenciaram várias correntes intelectuais posteriores, dentre as principais podemos ressaltar os sistemas de pensamentos fundados em uma interpretação mecanicista e materialista do universo, e os sistemas baseados no pensamento e na razão humana, esses sistemas tornaram obsoletas as concepções teológicas; a interação entre os dois primeiros sistemas de pensamento refletiu o advento das chamadas ciências modernas e o crescente efeito das descobertas científicas, bem como as transformações políticas e econômicas das sociedades humanas.
Concomitante a essas transformações, as sociedades européias do século XV viviam uma retração econômica fundamentada no antagonismo entre os dois sistemas produtivos, o feudal basicamente rural e o capitalismo em formação, basicamente urbano, o que levou essas sociedades a buscarem novas alternativas de crescimento econômico, a solução encontrada foi à expansão comercial e marítima dos séculos XV e XVI, e seus “descobrimentos” posteriores, o novo e novíssimo mundo.
Segundo Ross, “a expansão do comércio por todo o planeta e as necessidades que foram criadas pelas sociedades humanas, intensificou-se a apropriação dos recursos naturais”, essas necessidades cada vez mais crescentes marcadas pela intensificação comercial e pelo início do consumismo exacerbado fizeram com que surgissem “novas técnicas de produzir mercadorias, ou seja, fabricar equipamentos que agilizassem o transporte e gerassem maior produção de mercadorias a serem comercializadas” (ROSS, 1996, p. 213).
Essa fase de expansão do modo capitalista de produção, chamada de capitalismo comercial, marcada pela preponderância do capital mercantil sobre a produção, gerou o processo de acumulação primitiva do capital. Em decorrência disso, todo o capital acumulado na circulação das mercadorias começa a ser investido na produção, o que possibilitou o advento da Revolução Industrial na Inglaterra a partir da segunda metade do século XVIII.
“A Revolução Industrial decorre da intensificação do comércio, a contar dos descobrimentos – revolução comercial – e da valorização da natureza e gosto da investigação, levando a novas atitudes – revolução intelectual. O mercado cresce, o consumidor tem mais nível aquisitivo, é exigente: daí o trabalho sob outros padrões, sem limites da antiga corporação e com o culto do conforto”. (IGLÉSIAS, 2002, p. 93).
A partir de então, as sociedades humanas pautadas no desenvolvimento científico e no capital, adotaram um modelo de desenvolvimento baseado no aumento crescente da produção e, conseqüentemente, do consumo, aumentando a pressão na aquisição dos recursos naturais, gerando a degradação ambiental em todas as suas formas.
Com o advento da Revolução Industrial a concepção mecanicista e materialista de natureza se auto realiza. A idéia de progresso torna-se imperante. Todos os recursos naturais passam a ser visto como matéria prima geradora de novos produtos.
Busca-los onde quer que se encontrassem, torna-se uma obsessão, em um sistema econômico e social fundado na acumulação constante. Paralelamente, uma perigosa e falsa idéia são difundidas, a de que a capacidade da natureza de fornecê-los é desmedida, inesgotável.
A sociedade industrial consolidada na era contemporânea pautada nos avanços técnico-científicos, e na expansão do capitalismo industrial, promove efetivamente uma dissociação entre sociedade e natureza, como resultado, temos o acirramento da degradação do ambiente natural.
“O acréscimo do conhecimento técnico-científico dos séculos XVIII, XIX e XX possibilitado pelo capitalismo colocou definitivamente os interesses das sociedades humanas de um lado e a preservação da natureza de outro”. (ROSS, 1996, p. 213).
Uma outra característica da sociedade industrial é o crescimento acelerado das cidades, gerando o processo de urbanização, que de acordo com Spósito (1996, p. 49) se deu “a partir da intensificação da produção industrial, tornada viável tanto graças ao capital acumulado, como pelo desenvolvimento técnico-científico a que se denomina Revolução Industrial, a urbanização tomou ritmos muito acentuados”.
O elevado adensamento populacional e industrialização trazem sérios riscos ao meio ambiente urbano e rural, que alteram o intercâmbio orgânico entre o homem e a natureza impedindo principalmente à volta a terra dos resíduos da produção e do consumo que poderiam reconstruir a fertilidade, gerando todo o tipo de poluição.
A deterioração dos ambientes urbanos e rurais é conseqüência de um modelo de desenvolvimento pautado no crescente aumento da produção, do consumismo, da opulência e do desperdício, iniciados com a formação do modo capitalista de produção início do século XV, e acirrado com o advento da Revolução Industrial século XVIII e a formação da sociedade industrial urbana séculos XIX e XX, que ameaçam a sobrevivência das gerações futuras. Dentre as principais conseqüências desse modelo de desenvolvimento podemos citar: alterações climáticas; alterações do solo; assoreamento dos rios e lagos; aumento da temperatura da Terra; erosão do solo; desertificação; escassez de água potável; perda da biodiversidade; poluição do ar, da água, do solo, sonora, visual; redução da camada de ozônio; exclusão social.
3. Considerações finais
A relação entre sociedade e natureza tem sido caracterizada por uma série de inadequações, traduzida por uma variada forma de impactos ambientais que tem ameaçado a qualidade de vida do homem e sua própria vida. Assim processos erosivos, inundações, aquecimento da área central, são exemplos dos conflitos existentes entre sociedade e natureza na produção do espaço socialmente construído.
Ao produzir seu espaço, a sociedade o faz de acordo com seus interesses em termos de organização social e econômica, se apropriando do espaço, dos seus recursos naturais, minerais e energéticos, alterando sua forma, organização e constituição.
Esses processos iniciaram-se nos séculos XV e XVI, e intensificaram-se a partir do século XVIII, com o advento da Revolução Industrial.
O desenvolvimento dos sistemas produtivos e o conseqüente desenvolvimento econômico provocaram um avançado estágio de artificialização das relações entre sociedade e natureza, a degradação ambiental nada mais é do que um dos produtos desta artificialização.
Em termos gerais, o impasse contemporâneo da relação sociedade natureza, materializam-se nos chamados problemas sócio ambientais, que segundo Harvey (1980, p.268), “... reflete a ideologia prevalecente dos grupos e instituições dominantes na sociedade. Em parte, ela é moldada pela dinâmica das forças do mercado que podem, facilmente, produzir os resultados que ninguém em particular deseja”.
Neste sentido, esta artificialização do meio natural assume um caráter anti-social e antiambiental, na medida em que provoca a dilapidação do meio ambiente e secundariza o bem-estar humano, ao mesmo tempo tem-se mostrado ecologicamente predatório, socialmente perverso e politicamente injusto.
Além disso, a transformação de uma sociedade de produtores para uma sociedade de consumidores na passagem da sociedade moderna para a sociedade pós-moderna aumentou ainda mais a pressão sobre os recursos naturais, aumentando a degradação ambiental e prejudicando a qualidade de vida dos cidadãos.
Faz-se necessário à busca de modelos de desenvolvimento estratégicos e alternativos, visando à inclusão social, favorecendo a concepção de eco desenvolvimento como garantia de todas as formas de vida, buscando restabelecer um novo equilíbrio ambiental com características mais próximas do ambiente natural desejável.
4. Referências bibliográficas
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IGLÉSIAS, F. História geral e do Brasil. 2ª ed. São Paulo: Ática, 2002.
MENDONÇA, F. Geografia e meio ambiente. 5ª ed. São Paulo: Contexto, 2001.
ROSS. J. S. (org). Geografia do Brasil. São Paulo: Edusp, 1996.
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SPOSITO, M. E. B. Capitalismo e urbanização. 7ª ed. São Paulo: Contexto, 1996.

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